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um outro olhar

pequena nota técnica. e autobiográfica.

por Sarin, em 06.10.19

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Um processo é um conjunto de acções articuladas cujos procedimentos transformam entradas em saídas com um objectivo definido.

Parece uma definição complexa, cheia de aparentes tecnicismos; mas numa segunda leitura, reparamos que as palavras são de todos os dias. Os processos, se devidamente analisados, é que se revelam complexos - o que, felizmente, não significa serem difíceis ou serem demorados.

Se admitirmos, para efeitos da definição acima, que ir ao café é um processo, teremos como objectivo o ir beber uma bica ou comer um bolo ou estar com um amigo ou ir ler o jornal - ou tudo isto e o mais que apeteça.

As entradas serão essa qualquer necessidade de ir ao café, e também o transporte ou meio de locomoção, e ainda o dinheiro para pagar a despesa, e tudo o mais que for imprescindível para tal desidério.

As actividades incluirão a deslocação, o estacionar se for o caso, o entrar no café, o decidir se se fica ao balcão ou à mesa, o escolher outro bolo porque esgotou o que apetecia, o mexer a bica mesmo sem açúcar porque hábito, e todos os outros verbos que acontecem numa estada normal no café.

As saídas serão o talão da despesa, a satisfação obtida com a ingestão do consumido, a informação que se reteve na conversa com o amigo e a informação que se transmitiu, a informação que se colheu no jornal, e tudo o mais que resulte daqueles minutos.

Estas saídas serão entradas noutros processos, nossos e de terceiros - a informação trocada pode ser esquecida ou pode desencadear outras acções noutros processos, o documento de despesa entra na contabilidade (ou não) de cada envolvido, o  café provoca um disparo na sistólica, enfim, poderemos dizer que as saídas, as consequências, deste processo serão as entradas, as causas, de outros. (Quantas mais saídas inconsequentes, inaproveitadas, maior o desperdício - dir-se-à que o processo não é eficiente. Mas mesmo pouco eficiente só não será eficaz se o objectivo não for atingido - sair unicamente para beber café e falhar a electricidade, pois sem electricidade não há bica e a saída foi uma perda de tempo. Mas estas definições são aqui um à-parte. Uma minudência)

 

Sim, a abordagem por processos é complexa. Mas torna-se simples com o treino, mais simples ainda quando não limitamos esta abordagem ao meio produtivo, empresarial. E tudo isto pode ser feito usando palavras simples e olhando o quotidiano como uma sequência de processos diários.

Faço-o profissionalmente há mais de  20 anos, pouco tempo menos do que aquele que levo estudando, educando-me neste modelo. E fazia-o instintivamente há muitos mais, não sendo tão metódica, claro, mas desde que me lembro que apenas aceitava as causas e as consequências se percebesse o que estava pelo meio. Talvez por isso me tenha sido tão fácil adoptar este modelo, talvez por isso me seja tão imediata esta forma de olhar.

É esta abordagem que me permite identificar, à luz dos meus valores, a iniquidade de um gesto feito entre uma boa causa e uma boa consequência. A maioria avalia as consequências e as causas, fala nestas, hasteia estas. Eu, muitas vezes, deixo o que todos falam e detenho-me naquilo que parece não ser relevante - o tal gesto iníquo. Não significa que não concorde com esta ou com aquela opinião sobre as causas ou sobre os efeitos (as entradas e saídas). Simplesmente, deixo aos outros o que já dizem e vou-me ao pormenor, porque vejo o processo e vejo também as entradas e as saídas que nada têm a ver com o objectivo anunciado. E aponto-as, por vezes apenas em jeito de breve comentário - mas fica o registo, minúsculo entre o vozear dos outros.

Porque para mim os fins não justificam os meios. Não me lembro de alguma vez o terem justificado, mesmo em miúda tinha consciência da tibieza do argumento do bem maior quando o mal menor são os outros que o suportam. E também não imagino forma de o virem a justificar - uma outra forma de dizer que, sendo possível vir a admitir o contrário, não será muito provável que algum dia aceite os fins independentemente dos meios.

Repito: os fins não justificam os meios. Quando importa saber o que se passa, onde muitos clamam "Que se lixe o segredo de justiça!" eu grito "Haja respeito pelo segredo de justiça! Mas expliquem porque está esta matéria em segredo de justiça!". Quando se exige justiça, onde muitos proferem "Que se lixem as leis, faça-se justiça!" eu vocifero "Faça-se justiça, e para isso revejam-se as leis!".

Sei que a minha abordagem confunde muita gente, e até me grangeia mimos que vão de burra a apoiante de assassinos. Mas não peço desculpa pela forma como vejo o mundo, e tenho pena que a inteligência que em alguns é imensa lhes escasseie na hora de perceber que estar contra alguém não significa aceitar todo o tipo de ataques feitos a esse alguém.

A tal abordagem por processos. A tal iniquidade entre a justa causa e a digna consequência. À qual fecham os olhos mas que a mim me indigna - porque ignorar a iniquidade tem preço, ainda mais em tempos de tantas iniquidades, de tantos atropelos aos factos, atropelos à Democracia, atropelos aos Direitos Humanos.

É a minha postura. E não serão os mimos que me farão mudar.

A ti digo lamentar que a raiva te tolde a visão. Ou talvez nunca vejas a minha perspectiva e não há visão a toldar, a raiva apenas mostrando o quão cego estás. Podes invectivar-me como e quanto te apetecer, não me ofende quem quer senão quem me merece consideração. E até isso muda, por muito constante que eu seja. Faz parte do processo.

[Cuidemos de todos cuidando de nós: Etiqueta respiratória. Higiene. Distância física. Calma. Senso. Civismo.]
[há dias de muita inspiração. outros que não. nada como espreitar também os postais anteriores]

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lançado às 15:55

Onde ideias-desabafos podem nascer e morrer. Ou apenas ganhar bolor.


Obrigada por estar aqui.



1 comentário

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De MJP a 06.10.2019 às 17:57

Parabéns, Sarin! 
Excelente reflexão!
(que subscrevo, na íntegra!)


Beijos*

[a palavra a quem a quer]:

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