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cabeçalho sobre foto de Erika Zolli
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Amar o próximo nunca lhe foi fácil, já o distante permitia-lhe intacto o coração. Fora quebrado uma vez, doera por muitas vidas.
Mas tentara. E falhara, as cuidadas muralhas isolando o chão macio da sua alma.
Sem dor, abraçou o destino de se preferir só do que mal compreendida.
E sorriu ao ver a vida avançar, ao saber as pessoas emparelhadas por tantos e tantos motivos que nem saberia interpretar.
Sempre precisou de interpretar. Interpretar, perceber, aceitar, compreender - sentir nunca foi suficiente.
Talvez seja insensível. E nem sinta a dor no macio chão escondido pelas muralhas que cuida com amor. E nem sejam lágrimas, aquela tristeza de que quem a compreenda talvez exista - mas não no mesmo tempo ou não no mesmo espaço que ela. Ninguém demoraria tantas vidas para se encontrar.
Dói-me o corpo das batalhas que encetei.
Dói-me o corpo, não a vontade
- a última fronteira.
Lutei, abracei,
dei tudo de mim
- e ainda assim fiquei inteira.
Por isso me pergunto
- como me achei
se nunca me perdi?
E assim me vislumbro nos pedaços não estilhaços
que de mim vou encontrando por aí
- sei que não os deixei espalhados,
não os dei, menos vendi.
Encontro lampejos meus,
do que serei.
E vivi.
(não datado. Antigo. E actual)
Quando o Diabo arribou
a aldeia fugiu.
Esqueceram uma menina
que chorou
e o Diabo sorriu.
É que a menina não tinha medo...
tinha, mas não dele.
Era o medo da noite
do silêncio
do papão
- mas do diabo não.
(porque quando a aldeia fugiu
não teve tempo
para gritar
que aquele era o diabo
que os havia de levar)
Mas
lembrava-se o Diabo
de ter sido pequenino
e por isso
do seu olhar jorrou luz
que iluminou a noite.
E a menina
riu
e o silêncio morreu com a escuridão apagada
- os olhos do Diabo.
Quando a aldeia voltou
tudo estava sossegado.
Intacto.
Menos a menina,
que não apareceu.
Devolveu a alma ao Diabo
e morreu.
(Não datado. Década de '90)
Em dois pontos distintos do mundo, duas mulheres responderam simultaneamente e com os olhos brilhantes: "sim, amo!".
Uma respondia a um "Amas-me, querida?".
Outra, a um "Faz o que te digo ou mato-te!"
Em dois pontos distintos dum mundo distante e indiferente. Quantas vezes na porta ao lado.
(Abril 2012)
dóis-me no sangue sem me ferires. e por isso quero os passos que não damos no espaço que temos no tempo que não tivemos. quero o tempo e quero o espaço. quero os passos. porque me ris no sangue à gargalhada.
(Setembro 2011)
queimava-os a amizade arrastada, o amor abafado, o ponto que nunca foi exclamação nem final.
gelada pela ausência, percebeu que falar mais uma vez não era repetição, era conquista. conquista dela - do orgulho, da tristeza. se conquista dele, logo se veria.
e por isso disse-lhe, no jeito tímido que sempre usou: "há dias em que finjo que não, mas tenho saudades tuas."
aguardou. com a noite veio a claridade: quem cala não sente.
(Abril 2012)
um dia
dir-te-ei como o meu rumo e o teu rumo não se cruzam,
são um só.
e porque não o sabes te perdes de mim.
e porque o sei
me perco de mim quando sem ti.
(Maio 2012)
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