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O Rubicão da Ilha do Faial

por Sarin, em 06.11.20

O PSD chegou a acordo parlamentar com o Chega nos AçoresO Chega aprova o programa de governo da Traquitana (Caranguejola foi, irrevogavelmente, a de 2013) e, em troca, obtém o apoio do PSD para implementar algumas das medidas previstas no seu programa.

"Alcançar as metas de redução significativa de subsidio-dependência na região", a "criação de um gabinete regional de luta contra a corrupção" e "desencadear, nos termos das suas competências próprias, um projecto de revisão constitucional regional que inclua, entre outros aspectos, a redução do número de deputados na região autónoma dos Açores". Das duas últimas falarei depois, hoje e agora quero concentrar-me na questão da subsidio-dependência.

Os subsídios de que falamos são, de acordo com o que Ventura tem apregoado desde os seus tempos do PSD em Loures, o Rendimento Social de Inserção. o famigerado RSI.

Resolvi olhá-lo em detalhe. E descobri que em Setembro de 2020, ano de pandemia, o RSI ajudou 211.992 cidadãos. Foram 288.112 em 2017, ano em que, todos juntos durante 12 meses, consumiram ao Estado 344.098.000,0€. Exacto, trezentos e quarenta e quatro milhões e noventa e oito mil euros. Façam as contas por cabeça.

Estes 344.098.000€ inteirinhos, não a metade que o Chega deseja dispender, representam, por exemplo, cerca de 8,85% dos três mil oitocentos e noventa milhões de euros de garantia acordados em 2017 com a Lone Star pela venda do Novo Banco - o banco bom do BES que pertenceu ao grupo onde foi gestor o actual dirigente do Chega, Salvador Posser de Andrade. Por exemplo. Também gostaria de comparar com o salário acumulado de Ventura, mas embora tenha uma ideia de quanto ganham alguns políticos para falar de política, não encontrei nada sobre quanto ganham para falar de futebol. Suspeito que muito, para Ventura preferir falhar debates em campanhas eleitorais a ter de falhar compromissos contratuais. Bom, mas são estes dados apenas uma curiosidade, para colocar os números e as prioridades em perspectiva.

 

Outra curiosidade é a forma usada pelo Chega para elaborar os seus programas. 

Sim, refiro-me ao desconhecimento das leis que pretende reverter:

Programa Político 2019 (Chega)

Programa de Acção Política / IV – Funções subsidiárias e/ou supletivas / 3. Segurança Social

e) Ao rendimento mínimo garantido, terá de corresponder a obrigatoriedade de serviços prestados à comunidade;

Lei n.º 13/2003, de 21 de Maio
Revoga o rendimento mínimo garantido previsto na Lei n.º 19-A/96, de 29 de Junho, e cria o rendimento social de inserção.

 

Mas também me refiro à falta de solidariedade social implícita nesta sua abordagem, que condiciona o apoio social à obrigatoriedade de prestar serviços para receber um subsídio. Refiro-me à subversão dos conceitos: meus amigos, quem presta serviços, trabalha, e a retribuição do trabalho chama-se salário, não subsídio!  Dúvidas, consultem o artigo 258º do Código do Trabalho.

 
 

Enfim. O Chega permite ao PSD formar governo na Região Autónoma dos Açores. Em troca, o PSD reverte medidas cujos custos são irrisórios mas que prejudicarão gravemente muitos dos mais de 20.000 cidadãos que, nos Açores, dependem do RSI.

Foi isto que os açorianos escolheram? Não sei. Mas sei que foi isto que o PSD escolheu quando se vendeu por 4 anos de poder.

E isto não é apenas o corte nos apoios sociais, ou a diminuição da representatividade democrática nas assembleias legislativas. Isto é a conivência com o fascismo.

Isto é uma questão de Moral. Do limite que estamos ou não dispostos a atravessar. O PSD atravessou o Rubicão.

Não há retorno.

 

Convido-vos a ouvir o que diz sobre Trump um jornalista defensor da Segunda Emenda (Porte de Armas).

Sabe do que fala. Está a vivê-lo.

 

nota: correcção às 19h00. erro na leitura dos valores do RSI - são em milhares de euros e não em euros.

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lançado às 17:51

Não sei de quantas palavras precisarei para partilhar o tanto que esta ausência me doeu. E moeu.

A semana passada fiz uma incursão pelo Twitter. É interessante, é imediato... mas não permite acariciar as palavras. Tenho saudades disto. De vós!

Devagar, convocarei Menestrel e Bobo. Por agora, apenas a Almoxarife tem uma palavra para vos deixar. Ou várias, na verdade.

 

Cansei-me da leviandade com que os órgãos de comunicação social tratam as notícias.

Cansei-me da impunidade com que os políticos fazem afirmações sobre alegados factos nunca comprovados.

Cansei-me da inactividade das tutelas e dos reguladores perante os desconchavos que são proferidos, aventados, alardeados neste jardim por florir.

Estou disponível para assinar reclamações, petições e manifestos pela responsabilização dos oradores em praça pública.

A opinião é livre, os factos não são manipuláveis.

 

Para começar, 

Pedido de Esclarecimento sobre declaração pública de Nuno Melo, eurodeputado

 

Se concordarem, assinem. Basta clicar na imagem.

Até amanhã. A sério :)

 

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lançado às 20:00

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A meritocracia é a melhor forma de progressão. Nos estudos, na profissão, na opinião pública.

Claro que a noção de mérito é muito variável e, até, incompreensível - basta olhar os quadros de honra das escolas e os quadros de honra das estações televisivas, vulgo audiências.

A posição nas listas de classificação parece ser a medida de valor mais usada em Portugal - mesmo, ou principalmente, quando não se conhecem os critérios de avaliação, porque o que interessa é a posição no sagrado ranking. Mas desvio-me da minha questão, não quero falar da perversão* dos rankings e sim da meritocracia.

Estou em crer que apenas os apologistas do compadrio serão contra um sistema que avalie as capacidades e competências de cada um e que premeie os mais competentes, os mais capazes.

Mas a meritocracia tem um grave problema, que fere mortalmente o desígnio de a cada um conforme as suas capacidades: nem todos têm as mesmas oportunidades para desenvolver e apresentar as suas capacidades.

Um aluno bem alimentado numa casa confortável tem condições de estudo e de desenvolvimento muito diferentes das de um aluno numa casa húmida e gelada no Inverno e muito quente no Verão, onde a alimentação pouco varia pois, mais do que obedecer à roda dos alimentos, interessa conseguir ter o que comer todos os dias. Falo do conforto térmico da casa e da diversidade alimentar mas poderia falar da privacidade e da diversidade de oferta cultural, do conforto sonoro e da diversidade das actividades extra-curriculares; falo, na verdade, de tudo isto e do seu reverso, o nada disto.

Talvez que uns pais tenham trabalhado mais do que outros para agora poderem oferecer melhores condições? Talvez sim. Mas pode muito bem acontecer que talvez não, que, apenas, também eles tenham sido criados em casas semelhantes e não tenham conseguido trabalho suficiente.

A criança excepcional que, apesar da casa fria e da alimentação monótona e de tudo o mais que lhe é menos, consegue singrar nos estudos e ser a melhor das melhores é isso mesmo, excepcional. Pelas suas capacidade e determinação, muito acima da média, e pela frequência com que tal acontece.

Das duas, uma: ou apenas consideramos meritórios os esforços da criança que sai da tal casa fria e chega ao quadro de honra, ou teremos de aceitar que a corrida para o mérito arranca viciada logo na partida.

Esqueçamos de onde partiu, essa etapa vencida, e avancemos do quadro de honra para a profissão, pois mesmo que uma pessoa seja muito mais (ou muito menos) do que a sua profissão, se sem outros rendimentos será desta que se alimentará.

Temos a criança já adulta e com estudos concluídos com notas brilhantes, e é hora de a acompanhar no mercado de trabalho. Uma mulher numa empresa privada dificilmente ocupa cargos cimeiros antes dos 40-45. Não será por falta de mérito, até porque é mérito adicional trabalhar com dores e humores menstruais; e ainda mais meritório é trabalhar com o centro de gravidade a deslocar-se a cada dia, com o desconforto do volume e do peso nas pernas na bexiga nas mamas, e as dores e a sensibilidade e a emoção e os enjoos... mas é este um tipo de mérito que atrasa a progressão de uma mulher na profissão*. Este e outros, mais comezinhos mas felizmente cada vez menos frequentes. Já na administração pública torna-se mais fácil, os concursos nacionais não olham ao género. E há as quotas, aquele mecanismo de discriminação positiva sem o qual os homens que decidem continuariam a decidir-se maioritariamente por homens. Não por terem mais competências, mas por não terem os méritos errados.

Peguemos agora no homem saído do quadro de honra, e coloquemo-lo numa sala de futuros empregadores, todos nos seus fatos e charutos, incluindo os homens da sua turma que não saíram do quadro de honra. Todos nos seus fatos excepto ele, que nunca ligou ao que vestia desde que andasse limpo e, de preferência, sem publicidade gratuita a marcas cujas peças pagava. Não se encaixa naquela sala, mesmo que tenha a pele certa e não tenha tatuagens nos braços nus nem brinco nas orelhas lavadas. E isso lhe dizem ainda, que a ausência do charuto ainda passa, mas sem fato... e o homem saído do quadro de honra tem de levar o preconceito às compras de um fato talhado com outro mérito.

 

Este é o problema da meritocracia: se as casas de partida e as casas de chegada não são iguais, não se podem comparar os caminhos. Porque não falamos de pequenas discrepâncias mas de profundas diferenças estruturais e, por isso, estruturantes.

Antes de podermos defender um sistema de mérito, temos de garantir que as oportunidades são semelhantes.

Porque pugnamos por direitos e deveres iguais, é esta regra constitucional que todos os cidadãos desejamos ver cumprida. Mas a sociedade e a lei não marcham no mesmo compasso, a questão do mérito disso sendo prova.

Será ou ingenuidade ou imbecilidade, supor que se pode falar de deveres sem falar de direitos. A inversa não é verdadeira - o adulto a quem hoje exigem os deveres pode ser a mesma criança a quem ontem não garantiram os direitos.

 

 

* há mais perversões. há mais rankings. há muitos critérios.

** artigo de 2019. nada mudou.

imagem: pormenor da escultura em bronze Self made man, de Bobbie Carlyle

 

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lançado às 12:30

Como se lava dinheiro

deixando-o ainda mais sujo

por Sarin, em 09.05.20

 

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lançado às 17:22

Agora que passou a Páscoa, poder-me-ão explicar...

qual a indignação com as tolerâncias de ponto?

por Sarin, em 16.04.20

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Agora que passou a Páscoa, e com ela a tolerância de ponto de dois dias, expliquem-me por favor: qual foi o motivo, qual é o motivo, de tanta indignação em torno das tolerâncias de ponto?

 

Um trabalhador precisa de, ou dá-lhe jeito, faltar por motivos não previstos na lei. 


No particular

Ou melhor, nas PME, que empregavam em 2018 cerca de  3 230 000 indivíduos

66, 4% do pessoal empregado,

79,6% do pessoal empregado por conta de outrem.

O trabalhador dirige-se ao patronato, directamente ou aos seus serviços de pessoal, e apresenta pedido para falta.

O patronato não aceita, e o trabalhador

ou pede (e aceitam-lhe) o dia para férias

ou não falta.

Se faltar, incorre em falta não justificada, sujeitando-se a todas as consequências que esta possa ter.

O patronato aceita o pedido de falta, o trabalhador não comparece ao serviço, a falta está e é considerada justificada, o trabalhador perde a remuneração correspondente ao tempo de falta e o subsídio de alimentação, e o tempo de falta abate na majoração das férias.

 

Na função pública

O patronato é o Estado, aqui representado pelo Governo, e as faltas justificadas estão reguladas e tipificadas nos Contratos Colectivos de Trabalho e demais instrumentos legais.

Se o trabalhador faltar sem ser por motivos previstos na lei, incorre em falta injustificada, sujeitando-se a todas as consequências que esta possa ter. 

Se, por acaso, o trabalhador pediu férias, goza o período como férias mesmo que o Governo o venha a decretar  como de tolerância de ponto. 

O Governo promulga a tolerância de ponto. Basicamente, decreta que o funcionário público que quiser usufruir de dispensa ao trabalho, naquele período, o poderá fazer pois a falta será considerada justificada. 

O Governo decreta tolerância de ponto, o trabalhador opta por não comparecer ao serviço, a falta está e é considerada justificada, o funcionário público perde a remuneração correspondente ao tempo de falta e o subsídio de alimentação, e o tempo de falta abate na majoração das férias. 

 

Afinal, 

O patronato aceita o pedido de falta, o trabalhador não comparece ao serviço, a falta está e é considerada justificada, o trabalhador perde a remuneração correspondente ao tempo de falta e o subsídio de alimentação, e o tempo de falta abate na majoração das férias.

=

O Governo decreta tolerância de ponto, o trabalhador opta por não comparecer ao serviço, a falta está e é considerada justificada, o funcionário público perde a remuneração correspondente ao tempo de falta e o subsídio de alimentação, e o tempo de falta abate na majoração das férias. 

 

 

Qual o motivo da indignação, exactamente? É por o funcionário público, quando lhe dá jeito faltar por motivos não previstos na lei, não ter a possibilidade de pedir ao patrão para lhe justificar a falta? Realmente deve ser chato, pá... 

 

 

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lançado às 15:47

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Em 2007 Sócrates anunciou um programa de incentivo à aquisição de computadores portáteis e a descontos em Internet de banda larga - uma medida que incluía alunos e professores. Logo muitas vozes se levantaram contra o despesismo, o populismo e a excessividade da medida.

13 anos depois, surge uma pandemia, as crianças ficam em casa com as aulas possíveis à distância...

... e logo se levantam imensas vozes, muitas das mesmas, contra as aulas online porque há muitos alunos que não têm computador nem Internet.

O que apenas prova que há pessoas que nem pensam a longo prazo, como não pensaram em 2007, nem pensam que uma situação de excepção, como o actual confinamento, obriga a medidas de excepção.

Se tivesse sido dada continuidade à medida, hoje a questão das aulas online seria muito mais pacífica, pois nestes 13 anos todas aquelas coisas que assustam alguns pais e familiares (onde me incluo), como violações de privacidade, protecção do direito de imagem e outros assim direitos e perigos, estariam mais do que precavidos, prevenidos, treinados, educados.

Ou não, uma vez que muitos pais e familiares continuam a colocar as fotografias das criancinhas nas redes, malvada Escola que agora quer filmar o interior das casas e quiçá os irmãos que se aproximem do aluno!

 

Ainda sobre o presente ano lectivo, concordo que o Ministério da Educação deve tentar salvar o possível. Mas não o pode nem deve fazer por questões estatísticas. Muito menos o pode fazer colocando em risco docentes, discentes e demais pessoal - colocando em risco a sua a saúde, ou a sua privacidade.

Sim, que os pais coloquem a privacidade dos filhos em risco é mau, mas é responsabilidade dos mesmos.

O Estado é que não pode alinhar em tamanha irresponsabilidade.

Não é fácil sentir perdido um ano lectivo por razões a que somos alheios. Razões que nos transcendem e sobre as quais nada podemos.

Lembro-me do tempo que os alunos do 12.º Ano de Escolaridade perdemos em 1989. Não foi fácil nem agradável de suportar ou recuperar. Não se podia recuperar com aulas pela televisão, mesmo que no-las quisessem ministrar - ficámos sete longos meses entre exames adiados, é hoje, é na próxima semana, sem saber se no ano lectivo seguinte ingressaríamos no ensino superior, tentaríamos melhorar notas ou entraríamos no mercado de trabalho... E o ano lectivo seguinte começou e o primeiro trimestre terminou com os exames por fazer, é hoje, é na próxima semana... Não, não foi mesmo nada fácil de suportar. Também não foi simples de recuperar. Mas recuperou-se. E descobrimos que se recupera mais facilmente meio ano lectivo do que a saúde ou a privacidade.

As crianças e adolescentes recuperam mais facilmente o tempo perdido do que se recuperarão das assimetrias criadas por sistemas transversais a alunos agora em aprendizagem domiciliária.

Há que tentar chegar ao maior número de crianças possível, sim, e há que não deixar instalar-se a ideia de férias de Março a Setembro, para que não percam hábitos de estudo nem se percam do trabalho já desenvolvido. Mas como se pode avaliar equilibradamente crianças e adolescentes que, na mesma sala de aula, já evidenciam diferenças devido ao acompanhamento familiar e que, agora, dependem quase inteiramente desse mesmo acompanhamento?

E, depois, com aulas a algumas disciplinas sujeitas a exame e com notas a todas, onde fica a tal avaliação contínua?

Já nem falo da minha discordância com os sistemas de avaliação assentes em exames - por muito que digam que a avaliação é contínua, sabemos serem os testes e exames que dão nota aos períodos lectivos.

Não, não vou entrar por aí, o que está em causa não é a revolução do Sistema de Ensino, embora pudessem aproveitar para finalmente o promoverem.

O que está em causa é a continuidade de um ano lectivo tanto para crianças e adolescentes que vivem em casas  com tecnologia, espaço e conforto como para crianças e adolescente que vivem em zonas sem Internet, que vivem em casas com outros irmãos e com pais em tele-trabalho, que vivem há meses entre quatro paredes...

Todos merecem aulas, e todos merecem cuidados de prevenção. Há soluções, é coordená-las - as aulas por televisão são um passo possível, assim a TDT não lhes falhe.

A isto voltarei outro dia, que agora interessam soluções imediatas -

que, por serem urgentes, não têm de ser também imponderadas.

Outras soluções haverá, entre programas de licença aberta e redes várias - o Governo tem um gabinete da modernização tecnológica e o Estado tem uma Comissão Nacional de Protecção de Dados, em conjunto hão-de perceber mais disto do que eu. Trabalhem como equipa, organizem-se com os professores, sempre com os professores, e tenho a certeza de que surgirão as soluções para que os trabalhos lectivos prossigam o mais equilibradamente possível.

 

Mas avaliações, nestes tantos contextos, parecem-me válidas apenas para os censos.

 

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lançado às 17:53

Violência doméstica e TIR

por Sarin, em 24.03.20

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Uma mulher de 60 anos agrediu um homem de 45. Este chamou a polícia, que deteve a agressora por suspeita de violência doméstica. Levada a tribunal para primeiro interrogatório, apurou-se que não teria sido o primeiro episódio de violência doméstica verificado. Foi aplicada à agressora a mais leve medida de coacção, o Termo de Identidade e Residência, conhecido como TIR [o TIR, não a TIR].

 

A notícia nada refere sobre a relação entre agressora e vítima mas, tendo sido tratado pelas autoridades como crime de violência doméstica, são certamente coabitantes na mesma residência.

Partindo do princípio de que a vítima retornou à residência, temos o Estado a colocar o agressor no espaço natural da vítima - o que se em situações normais é absurdo e um absoluto desprezo pelos direitos da vítima enquanto cidadão, em pleno estado de emergência é um aval à escalada de violência e das suas consequências.

Caso a vítima tenha sido  encaminhada para um centro de acolhimento, temos o Estado a premiar a agressora, permitindo-lhe permanecer no seu espaço natural, e penalizando a vítima, obrigando-a a abandonar os seus pertences e a refugiar-se num espaço desconhecido.

Pelo contrário, se a vítima voltou para casa porque quis, quis e quis muito bem, pois nada fez de errado para sair - a agressora é quem tem de ser efectivamente afastada, encaminhada para serviços competentes que determinem se a violência resulta de doença psíquica ou de deformação moral, e as medidas de coacção definidas em função do apurado. Compete ao Estado garantir que tal acontece. Mesmo num cenário em que a vítima se prontifica a cuidar da agressora e a chamada para a polícia tenha resultado de uma aflição passageira. A violência doméstica é crime público e as boas intenções fazem vítimas, não há que facilitar numa situação onde o receio ou a ameaça* imperou.

 

Onde estão os Planos de Contingência do Ministério da Justiça? Em situação normal, o Estatuto de Vítima e a forma como com ele se lida carecem de revisão profunda - mais se impõem os ajustes em tempos de confinamento.

E é nestas pequenas coisas que percebemos a inércia dos nossos deputados, a inépcia das nossas forças judiciais e de segurança nas abordagens aos indivíduos, a irrelevância de tantas entidades e associações de apoio humanitário actuando desarticuladas. 

Mas esta abordagem é, apenas, uma nota de rodapé na história da violência doméstica em Portugal.

 

 

* Há quem, lidando com familiares violentos por doença ou dependência, recorra à polícia como forma de tentar incutir-lhes temor pelas consequências dos seus actos, isto sem que tenha real intenção de os ver detidos e julgados. Mais uma vez, as boas intenções fazem vítimas e cabe ao Estado não o permitir - a violência doméstica é crime público também para evitar tais benevolências.

 

 

imagem: "Mulher batendo num homem com vassoura" (autor desc., pintura de Kalighat, 1875), domínio público.

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lançado às 20:05

Onde ideias-desabafos podem nascer e morrer. Ou apenas ganhar bolor.


Obrigada por estar aqui.




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