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Não me canso de o dizer: o jornalismo é fundamental para a democracia.
A propósito deste meu postal, um comentador também ele bloguista afirmou que "o foco não deve ser o jornal público" mas sim as actuações do regulador e dos seus responsáveis.
Discordei parcialmente mas, porque o digo tanta vez, não expliquei porquê. Talvez seja bom relembrar. Genericamente.
A Democracia assenta em 3 pilares: o Poder Legislativo, o Poder Executivo e o Poder Judicial. Ao qual se junta um outro, o chamado quarto poder, informal mas muito importante porque escrutina e questiona os outros três: a Comunicação Social.
Supõem-se e desejam-se independentes uns dos outros, e espera-se que sejam transparentes e auto-regulados, com o quarto poder a ter especial papel nesta regulação por acompanhar, investigar, registar, divulgar e cruzar as actuações de todos, trazendo transparência a processos mais obscuros.
Sabemos, no entanto, que estamos longe da tal transparência e da tal auto-regulação dos poderes, e todos os dias notamos (e uso o plural porque a muitos o leio) que os jornais, qualquer que seja o canal usado, pouco têm contribuído para o tal escrutínio e para a tal transparência que se espera da sua acção.
Portanto, se notamos e apontamos as falhas na definição ou no desempenho do papel de um dos três poderes formais, porque não devemos questionar as falhas no desempenho do quarto, o jornalismo?
Até porque as falhas que apontamos aos outros três são-nos trazidas por este, quantas das vezes com a informação fragmentada, truncada, omissa... manipulada pelo vocabulário usado, pela estrutura dada, pelo posicionamento da própria notícia.
Questionar a forma da notícia, o quarto poder, não invalida questionar a notícia em si mesma, no caso os restantes poderes. Mas resulta sempre mais delicado quando não conhecemos nem sequer percebemos a dimensão do que nos é omitido - e as várias comissões parlamentares de inquérito que o digam.
Portanto, sim, continuarei a atentar na forma das notícias tanto quanto no seu conteúdo. Talvez até mais, pelos motivos expostos.
E não por ser mais seguro ou menos melindroso, não por simpatia ou preferência, mas porque mais objectivo: a forma da notícia está ali, à frente dos meus olhos. O conteúdo, porque incerto, exige-me muitas vezes cruzamentos de notícias várias em canais diversos - trabalho que deveria ser do jornalista, que não sou, e para o qual nem sempre tenho disponibilidade. Para quem nisto vê parcialidade, paguem-me e eu cruzarei elementos suficientes para escrever sobre o que quiserem - embora não como quiserem.
Já agora, porque a propósito, acrescento que tenho por princípio evitar discutir matéria em investigação - não porque não tenha opinião, mas porque suspeito da parcialidade da informação que me chega e, por extensão, da opinião que formo, que talvez queiram que forme. Mas tendo mais perguntas que respostas, o que me é normal em casos assim, posso chegar a ter suspeitas, ideias, mas nem lhes chamo opinião - e admiro aqueles que opinam com poucos dados. Admiro, não necessariamente respeito.
Assim, com uma opinião que nem o chega ser, esburacada por perguntas e alicerçada em omissões e factos fragmentados, discute-se o quê? Desconfio que apenas a opinião pública formatada à medida de insondados desígnios. E como considero que os investigadores e os juízes podem, sim, ser condicionados, influenciados, pela pressão da opinião pública, evito fazê-lo - por questões meramente de consciência, pois que não tendo voz fraca sei que pouco ou nada ecoa. Posso discordar das sentenças, mas creio nos mecanismos - e quando deles descreio, questiono a sua definição, o seu desenho, pelas falhas do mecanismo e não por me desagradar um resultado em particular.
Aparentemente, defender a regulação dos poderes também pelo escrutínio da comunicação social e depois advogar o silêncio para não condicionar a actuação dos escrutinados pode parecer paradoxal; mas não convém confundir os papéis de cada um: a justiça investiga e julga crimes, a comunicação social investiga e denuncia acções, não as julga, e o cidadão não julga as acções dos seus concidadãos mas sim as dos agentes do poder enquanto no desempenho dos seus cargos - para os julgar convém conhecer os factos e é aqui, exactamente neste ponto, que o postal inverte a cadência e volta aos parágrafos anteriores.
Estarei, com esta minha atitude, a rolar pedra montanha acima? Pelo menos não será castigo - e tenho consciência de que, se nada fizermos para a travar, é nas nossas costas que cai. Na nossa espinha, se por acaso não lhe sentem já o peso.
imagem de O castigo de Atlas, colhida no CulturaMix.com
Observação: notei, depois de publicar, que um dos parágrafos está destacado. Não foi propositado, não sei sequer como aconteceu; mas como ao telemóvel e o editor não tem função que me permita formatar a letra, fica indevidamente destacado até o corrigir ao pc. Ignorem, sff. Grata.
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