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Em 2007 Sócrates anunciou um programa de incentivo à aquisição de computadores portáteis e a descontos em Internet de banda larga - uma medida que incluía alunos e professores. Logo muitas vozes se levantaram contra o despesismo, o populismo e a excessividade da medida.
13 anos depois, surge uma pandemia, as crianças ficam em casa com as aulas possíveis à distância...
... e logo se levantam imensas vozes, muitas das mesmas, contra as aulas online porque há muitos alunos que não têm computador nem Internet.
O que apenas prova que há pessoas que nem pensam a longo prazo, como não pensaram em 2007, nem pensam que uma situação de excepção, como o actual confinamento, obriga a medidas de excepção.
Se tivesse sido dada continuidade à medida, hoje a questão das aulas online seria muito mais pacífica, pois nestes 13 anos todas aquelas coisas que assustam alguns pais e familiares (onde me incluo), como violações de privacidade, protecção do direito de imagem e outros assim direitos e perigos, estariam mais do que precavidos, prevenidos, treinados, educados.
Ou não, uma vez que muitos pais e familiares continuam a colocar as fotografias das criancinhas nas redes, malvada Escola que agora quer filmar o interior das casas e quiçá os irmãos que se aproximem do aluno!
Ainda sobre o presente ano lectivo, concordo que o Ministério da Educação deve tentar salvar o possível. Mas não o pode nem deve fazer por questões estatísticas. Muito menos o pode fazer colocando em risco docentes, discentes e demais pessoal - colocando em risco a sua a saúde, ou a sua privacidade.
Sim, que os pais coloquem a privacidade dos filhos em risco é mau, mas é responsabilidade dos mesmos.
O Estado é que não pode alinhar em tamanha irresponsabilidade.
Não é fácil sentir perdido um ano lectivo por razões a que somos alheios. Razões que nos transcendem e sobre as quais nada podemos.
Lembro-me do tempo que os alunos do 12.º Ano de Escolaridade perdemos em 1989. Não foi fácil nem agradável de suportar ou recuperar. Não se podia recuperar com aulas pela televisão, mesmo que no-las quisessem ministrar - ficámos sete longos meses entre exames adiados, é hoje, é na próxima semana, sem saber se no ano lectivo seguinte ingressaríamos no ensino superior, tentaríamos melhorar notas ou entraríamos no mercado de trabalho... E o ano lectivo seguinte começou e o primeiro trimestre terminou com os exames por fazer, é hoje, é na próxima semana... Não, não foi mesmo nada fácil de suportar. Também não foi simples de recuperar. Mas recuperou-se. E descobrimos que se recupera mais facilmente meio ano lectivo do que a saúde ou a privacidade.
As crianças e adolescentes recuperam mais facilmente o tempo perdido do que se recuperarão das assimetrias criadas por sistemas transversais a alunos agora em aprendizagem domiciliária.
Há que tentar chegar ao maior número de crianças possível, sim, e há que não deixar instalar-se a ideia de férias de Março a Setembro, para que não percam hábitos de estudo nem se percam do trabalho já desenvolvido. Mas como se pode avaliar equilibradamente crianças e adolescentes que, na mesma sala de aula, já evidenciam diferenças devido ao acompanhamento familiar e que, agora, dependem quase inteiramente desse mesmo acompanhamento?
E, depois, com aulas a algumas disciplinas sujeitas a exame e com notas a todas, onde fica a tal avaliação contínua?
Já nem falo da minha discordância com os sistemas de avaliação assentes em exames - por muito que digam que a avaliação é contínua, sabemos serem os testes e exames que dão nota aos períodos lectivos.
Não, não vou entrar por aí, o que está em causa não é a revolução do Sistema de Ensino, embora pudessem aproveitar para finalmente o promoverem.
O que está em causa é a continuidade de um ano lectivo tanto para crianças e adolescentes que vivem em casas com tecnologia, espaço e conforto como para crianças e adolescente que vivem em zonas sem Internet, que vivem em casas com outros irmãos e com pais em tele-trabalho, que vivem há meses entre quatro paredes...
Todos merecem aulas, e todos merecem cuidados de prevenção. Há soluções, é coordená-las - as aulas por televisão são um passo possível, assim a TDT não lhes falhe.
A isto voltarei outro dia, que agora interessam soluções imediatas -
que, por serem urgentes, não têm de ser também imponderadas.
Outras soluções haverá, entre programas de licença aberta e redes várias - o Governo tem um gabinete da modernização tecnológica e o Estado tem uma Comissão Nacional de Protecção de Dados, em conjunto hão-de perceber mais disto do que eu. Trabalhem como equipa, organizem-se com os professores, sempre com os professores, e tenho a certeza de que surgirão as soluções para que os trabalhos lectivos prossigam o mais equilibradamente possível.
Mas avaliações, nestes tantos contextos, parecem-me válidas apenas para os censos.
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