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Vi agora o Governo Sombra de ontem.

A propósito das comemorações do 25 de Abril, João Miguel Tavares disse algo como "Não sentir a necessidade de comemorar Abril é o sinal da vitória de Abril. Epá, sim, estamos a comemorar uma coisa que se tornou completamente natural e óbvia. Como as pessoas não comemoram a Restauração, porque já foi há muito tempo... Eu não me lembro como é que era antes, não consigo imaginar como é que era antes."

E é isto, a tradução de JMT e de muita gente sobre as comemorações oficiais: a História comemora-se até onde cada um tem memória. Tudo o mais é nada.

Acontece que não. 

 

Porque importam os sobreviventes, importam os filhos dos que não sobreviveram, importam os muitos que sofreram um passado ainda próximo.

A menos que não importem.

 

JMT e essa outra gente não têm memória. Não posso dizer que me lembre de muito, além da vaga noção de o meu pai ser uma fotografia - vaga, porque em 1975 foi substituída pelo original. Outros não tiveram tal sorte. Não terei muitas memórias pessoais, mas ouvi e ouço as memórias de quem se lembra de muito mais do que eu. Memórias de quem passou na António Maria Cardoso e à tortura disse nada, memórias de quem deixou Peniche com ossos mal soldados, memórias de quem para França foi a salto num assalto ao então futuro roubado, memórias de quem ficou e comeu a frase "tenho fome" apenas para não ser denunciado como agitador...  Memórias dos que se foram e comigo as deixaram.

Muitos seremos os que as guardamos, a estas memórias que, de parecidas, nos são comuns -  nos são memória colectiva.

E enquanto houver uma vítima  da ditadura, eu comemorarei com solenidade o Dia e Quem lhe entregou a Liberdade.

25 de Abril Sempre!

 

[Cuidemos de todos cuidando de nós: Etiqueta respiratória. Higiene. Distância física. Calma. Senso. Civismo.]
[há dias de muita inspiração. outros que não. nada como espreitar também os postais anteriores]

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lançado às 20:15

Onde ideias-desabafos podem nascer e morrer. Ou apenas ganhar bolor.


Obrigada por estar aqui.



17 comentários

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De Maria Araújo a 25.04.2020 às 20:45

Um passado de sofrimento para muitas mães, como a minha, que viram os seus filhos ir para a guerra, e  poderiam não voltar a vê-los vivos..



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De Sarin a 25.04.2020 às 21:09

Enquanto houver alguém a quem tal memória atormente, merece a comemoração solene do 25 de Abril!
Beijos, Maria, e a todos os teus
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De Maria Araújo a 25.04.2020 às 21:18

Na perseguição a Humberto Delgado , o meu avô paterno era um dos que a PIDE vigiava.
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De Sarin a 25.04.2020 às 21:28

Dias difíceis, esses :(
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De Sarin a 25.04.2020 às 21:30

Quem se lembra tem de contar, para que os joões miguéis tavares não aleguem desconhecimento.
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De Maria a 26.04.2020 às 08:53

Lembro-me da Pide e das atrocidades que cometeram. Lembro-me tao bem do B, que viu a vida roubada pelas torturas na prisão, enlouquecer aos poucos.
Vi a "frigideira " na prisão  do  Tarrafal. 
Vi o medo quando a Pide invadia as casas dos vizinhos.
Vi.mães perderem  filhos na guerra. 
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De Sarin a 26.04.2020 às 09:21

Vivendo próxima do Tarrafal, viste o que nenhuma criança deveria ver.
E enquanto houver quem tenha visto, quem tenha sentido, quem tenha perdido a inocência ou família às mãos da ditadura, eu comemorarei o Dia da Liberdade!
Um beijo grande
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De Rik@rdo a 26.04.2020 às 11:33


Onde assino?
.
Um domingo de paz e amor
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De Sarin a 26.04.2020 às 17:08

Já assinou :)


Obrigada, Rik@rdo, um bom domingo para si também
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De cheia a 26.04.2020 às 23:39

Por causa da guerra perdi os primeiros 4 anos da minha filha mais velha, felizmente não perdi a vida.


Boa noite
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De Sarin a 27.04.2020 às 00:44

A perda do primeiro sorriso, primeiro passo, primeira palavra... e a angústia de não saber quando ou como voltar e abraçar, e a saudade do tempo roubado. Felizmente o 25 de Abril deu-lhe todo o tempo depois :)
Um beijo virtual, caro José, e boa semana.
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De Existe um Olhar a 27.04.2020 às 10:26

Tenho memórias e relatos de quem muito sofreu.
O meu respeito e uma vénia para todos.
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De Sarin a 27.04.2020 às 17:19

Uma vénia e um abraço agradecido.
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De simplesmente... a 27.04.2020 às 19:09


Boas e más memórias. Nem tudo foi mau "naqueles tempos". A meu ver, as guerras coloniais foram horríveis. Familiares meus safaram-se delas … "abalando", a salto, para o estrangeiro. Outros não tiveram tempo ou oportunidade ou vontade … para "saltar" daqui para fora. 
Agora o "inimigo" é outro: está a transformar todos nós em "eremitas". 
Também isto ficará na História.
E mais tarde será lembrado … provavelmente pelos nossos Netos.
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De Sarin a 27.04.2020 às 19:15

Colectivamente, pouco foi bom - e esse pouco não o foi para todos. Individualmente, sim, que povo seríamos se individualmente não tivessem arrancado sorrisos entre a penumbra.


Seremos eremitas no dia em que deixarmos de comunicar e de pensar nos outros - está isolado quem se fecha em si, com ou sem abraços.
Obrigada pela visita :)
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De MariaLi a 28.04.2020 às 00:35

Era difícil ser mãe, pai, irmã, ter um familiar na guerra. Tempo de sufoco, tão triste.
Recordo a minha mãe, quando sorria para os outros filhos, os mais novos, logo cobria os lábios, como que arrependida por estar feliz... 
Três irmãos, os mais velhos, estiveram na guerra. 
Bjinhos, Sarin e parabéns pelo teu texto. 
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De Sarin a 28.04.2020 às 00:48

O sentimento de culpa pelos mais velhos - muitos sofreram o estigma de serem novos, e a muitos foi exigido que se comportassem como os irmãos mortos ou ausentes, numa quase anulação de si mesmos.
Não terá sido fácil para quase ninguém, acredito, a as vítimas não foram apenas os mortos e mutilados da guerra e da prisão.
Por isso ficar estupefacta quando gente racional usa o argumento da desmemória.
Obrigada, Mariali. Pelas tuas palavras e pelo teu testemunho.
Beijos, boa semana

[a palavra a quem a quer]




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