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Vejo as hostes agitadas com o novo papão que aí vem, a grande questão fracturante deste ano: Eutanásia.
Ocorrem-me duas grandes questões nesta matéria:
1. Para ser fracturante seria necessário que se discutisse. Mas apenas vejo a) certezas nos que a imoralizam e b) dúvidas nos que a defendem - dúvidas por exemplo com a posição dos Bastonário e Ex-Bastonário da Ordem dos Médicos que parecem querer travar com o código deontológico aquilo que na Assembleia estão com vontade de deixar passar.
2. Porque insistem alguns sectores da sociedade em querer referendar matéria de direitos e liberdades individuais e não se preocupam com a regulação da coisa comum.
Hoje fico-me pelos direitos e liberdades individuais. E respondo aos dois pontos em simultâneo...
O meu corpo é meu.
É meu para o prostrar nos altares que entender; para o deitar nas camas que eu fizer, quando e com quem me apetecer; para fazer e parir os filhos que eu desejar e conseguir; para o desligar quando eu quiser.
Vivemos em sociedade, é certo, e as nossas acções afectam os outros – a saúde pública, a demografia e a segurança pública à cabeça, do lado do Estado; as emoções e as interdependências, do lado das Famílias.
E ainda assim somos um conjunto de corpos individuais que pensa e sente individualmente mesmo que em grupo.
Mas estou a falar de me permitirem fazer o que quero ao meu corpo. Ao meu corpo vivo, ao meu corpo morto e ao meu corpo assim-assim. À minha vida, a mim!
Não de obrigar os outros a fazerem o que eu quero ao corpo deles, à vida deles, a eles. Não de obrigar os outros, definitivamente NÃO!
Quando fiz o meu Testamento Vital preenchi o formulário no local, fui entrevistada, identificada e assinei. Voltei à Delegação de Saúde para o voltar a preencher: entre as minhas instruções várias, não me autorizaram a instrução para me desligarem a vida, só autorizaram desligarem-me máquinas.
O facto de eu, lúcida e na plena posse das minhas faculdades, não poder dar todas as instruções que queria deveu-se a um abuso legal: o Estado não manda no meu corpo vivo nem manda no meu corpo morto, mas manda no meu corpo moribundo independentemente do meu desejo. Se eu, lúcida, posso decidir tudo – incluindo o que fazem ao meu cadáver e aos meus órgãos e aos meus bens – porque tenho que deixar o limbo nas mãos dos meus familiares ou do acaso?! Só porque aos meus concidadãos lhes dá para sentir de forma diferente?! Eu quero decidir por mim e preferia não ter que decidir por ninguém: é doloroso, é devastador, é violento.
Entretanto aproxima-se a data de revalidação do meu Testamento – podemos mudar de ideias a qualquer momento, e para o caso de nos esquecermos de o registar, de cinco em cinco anos temos que renovar os nossos desejos. Está quase na altura de o meu ser renovado, e espero desta vez poder deixar os meus desejos registados.
Caramba, se há processo cuidado que exija atenção e certeza é este!
Se alguém se sente inseguro ou se recear mudar de ideias quando chegr a hora da verdade, então nitidamente esse alguém não deve fazer um Testamento Vital - apesar de o Testamento permitir deixar algumas ou todas as decisões à família...
Porra, e é uma pessoa destas que em sede de referendo querem pôr a decidir sobre o fim da minha vida?!
Sobre os médicos e enfermeiros: senhores Bastonários, objectores de consciência sempre houve. Anjos da morte também. Que tal aligeirarem o fardo e clarificarem o papel do eutanasiador – não é um homicida, é um profissional de saúde que atende aos desejos devidamente expressos pelo seu doente já não paciente. Comecem por rever o Código, caso seja aprovada a Eutanásia – manter determinadas expressões será contraditar a lei em cada leitura, e invocar a nulidade do parágrafo para “tornar desnecessária qualquer alteração” é manobra nada inocente por parte de quem assumidamente objecta a eutanásia. Haja decência!
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