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Têm sido habituais as vozes contra as praxes. Genericamente, e simplificando, uns argumentam contra a violência que se tem verificado, outros contra a humilhação gratuita, outros contra a hierarquização dos estudantes entre si.
Em comum, pedem o fim da praxe. A regulação ou a proibição da praxe.
A violência e a humilhação não resultam da praxe mas de quem a conduz - um imbecil será sempre um imbecil, numa praxe ou em qualquer lugar onde possa exercer autoridade, ainda que uma autoridade relativa. Portanto, o problema da praxe será, aqui, o de facilitar um palco aos imbecis.
Será isso motivo para a proibir? Penso que, já que gostam de proibir, seria mais produtivo proibir a imbecilidade, pois os que não se revelam na praxe revelar-se-ão assim que com subalternos - e nessa altura já será tarde para os responsabilizar. Mas adiante.
Excluídas assim, e liminarmente, as causas violência e humilhação porque não inerentes à praxe, resta a questão da hierarquização entre pares. Será grave, esta hierarquização? Toda a sociedade está hierarquizada: no trabalho, entre trabalhos, no lazer, na família... até num grupo de café há os que lideram as conversas, os que seguem a linha de conversa e os que aguardam que os primeiros se riam para rirem também... A hierarquia não é novidade, a sua dinâmica é que o poderá ser. Porque pertencer a uma estutura, qualquer estrutura, passa por ocupar um lugar definido e respeitar algumas regras, e no ensino superior, passados os períodos tradicionais de festa, não há efectiva hierarquia entre os alunos dos vários anos de frequência universitária. O que verdadeiramente interessa, parece-me, é que a dinâmica da praxe não seja abusiva e que a participação seja encarada como facultativa - uma opção pessoal e intransmissível.
Prova do que acima afirmo parece ser o entusiasmo com que todos estão a receber estas "praxes ecológicas", que levam os novos alunos a recolher lixo de praias ou ruas enquanto os alunos mais antigos vigiam os trabalhos. Existe uma hierarquia, os alunos continuam a agir sob odens de outros alunos. Portanto, a hierarquização dos estudantes também não será o problema.
Então, porque querem afinal proibir ou, pelo menos, regular as praxes?
Talvez porque se aligeira a demissão de responsabilidades por parte dos progenitores - proíbam as praxes porque falhei na educação dos meus filhos não é argumento para se orgulharem.
Ou porque disfarça a demissão de responsabilidades dos jovens adultos - proíbam as praxes porque sozinho sou boa pessoa mas em grupo ajo como imbecil; proíbam as praxes porque sozinho sou independente mas em grupo não quero ser diferente; proíbam as praxes porque em grupo divirto-me e talvez abuse mas quando sozinho envergonho-me e digo que fui obrigado... vários argumentos pouco dignificantes que ninguém quer usar.
Afinal, o problema da praxe está em permitir que as pessoas se revelem, assim logo à entrada da idade adulta.
E nada como infantilizar, proibindo a sua existência usando não se percebe bem que argumento quando todas as leis necessárias estão escritas. E moralizando, não convém esquecer a moralização subjacente a tal proibição. Porque, afinal, há praxes boas e praxes más.
postal sem imagem. porque estou de luto pelo espírito académico, pela cidadania, pela liberdade.
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