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[Tema #2: O amor e um estalo]
O amor e um estalo
O filho a cair-lhe nos braços e o seu amor a estalar-lhe no peito, de tão imenso rasgando-lhe o coração e o mundo. Descobriu, mais do que decidiu, ser agora daquela coisa minúscula e engelhada que chorava e cheirava a sangue, ao seu sangue, que lhes corria no corpo e ainda o cobria.
Deu-lhe pela noite peito e atenção, dorme, filho, foi-se embora o papão.
Contou-lhe os passos prendendo-o em si, vem, filho, a mãe está aqui.
Afagou-lhe maldades e enganos da rua, a culpa sei, filho, não pode ser tua.
Limpou-lhe lágrimas mais leves por hora, não chores, filho, que um homem não chora.
Tirou-lhe as canseiras de homem-criança, deixa que eu faço, filho, descansa.
Embalou-lhe os azares que não sortes do amor, esquece, filho, tens direito a melhor.
Sofreu-lhe as derrotas num alento incansado, anda, filho, o mundo é malvado.
Ouviu-lhe a palavra gritada, ruim, tem calma, filho, não fales assim.
Percebeu-lhe a fúria agitando-lhe a mão, cuidado, filho, que caio ao chão.
O punho a cair-lhe no peito e o seu amor a estalar-lhe os braços, de tão imundo rasgando-lhe o coração imenso. Descobriu, mais do que sentiu, ser agora aquela coisa minúscula e engelhada que chorava e cheirava a sangue, ao seu sangue, que lhe escorria do corpo e já a cobria.
Nota de rodachão: À diversidade da Língua Portuguesa tenho amor e um estalo dou ao AO90.
Imagem: Uliana Lopatkina dançando “A morte do cisne”
(coreografia de Michel Fokine, música de Camille de Saint-Saëns)
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