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A produtividade e o salário mínimo

por Sarin, em 03.12.19

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Segundo a notícia do Eco, o Fórum para a Competitividade "estima que o aumento do salário mínimo possa provocar a perda de 50 a 100 mil empregos se não for acompanhado de uma melhoria da produtividade."

Antes de mais, não é o Fórum que estima - é Ricardo Braz Teixeira, Director do Gabinete de Estudos do Fórum para a Competitividade e autor do texto "Riscos da subida do salário mínimo", constante na nota de conjuntura n.º43 (*). Um texto de um autor, mesmo que director de uma entidade plural, não é exactamente o mesmo que uma posição conjunta dessa entidade. Cansa chover no que deveria ser molhado, de tão líquido... Adiante. 

Fico sempre muito entusiasmada quando vejo alguém explicar que o salário mínimo não pode aumentar muito acima do mínimo, que já é e continuará a ser misérrimo, por questões de "produtividade".

O pessoal é distraído e costuma associar estas coisas da baixa produtividade a "muitos dias de férias", a "muitos feriados", a "muita dificuldade em sancionar e despedir empregados"... Deve ser por isso que os primeiros a sofrerem os efeitos da "baixa produtividade" sejam sempre os trabalhadores, nunca os gestores intermédios e de topo. Que nunca são responsáveis pelos investimentos duvidosos, pela má organização do trabalho, pelo deficiente desenvolvimento do produto, pela péssima distribuição.

 

E de que contrapartidas fala o patronato, perdão, o autor nesta nota de conjuntura (**)?

Reforma do sistema formativo

Esquece-se o autor de que os estágios profissionais são usados como fonte de mão-de-obra barata pelas entidades que os acolhem? Terá olvidado que as empresas podem e devem ministrar formação aos seus funcionários de acordo com planos formativos que pouquíssimas empresas desenvolvem, nem sequer recorrendo aos serviços formativos do Estado? Não é apenas o sistema formativo que tem de ser reformulado, é também a lógica do patronato.

Atração do Investimento Direto Estrangeiro (reduzindo a taxa de IRC, acelerando licenciamentos, estabilidade regulatória, entre outras)

E porque não acelerar licenciamentos e garantir a estabilidade regulatória, entre outras, para promover o Investimento Directo Nacional?! A captação de capital estrangeiro é importante, mas a aposta excessiva nesta captação traduzir-se-à também na perda dos poucos sectores que ainda dominamos no nosso país, além dos riscos de segurança que tais captações têm representado... E reduzir o IRC? Porque não fomentar antes o reinvestimento na empresa e impedir a saída de capitais para empresas-fantasma, entre outras?!

Aumento da intensidade do investimento de qualidade (quer público quer privado)

É interessante perceber como, agora, já queremos outra vez Obras Públicas. Com as quais, aliás, concordo, embora discorde da moda de investir para dar à exploração - as PPE e as concessões têm sido assim como que uma rocha na sapateira, não apenas uma pedra no sapato.

Promoção do aumento da dimensão das empresas (redução do IRC sobre os lucros retidos, benefícios fiscais na aquisição e fusão de empresas)

Vá, aqui assino por baixo; vale o que vale, mas uma pessoa também tem direito a apor a assinatura ao lado dos ilustres - principalmente no seu próprio blogue! Mas, caramba... falta uma notinha sobre as aquisições hostis. E sobre a penalização das empresas que impõem preços e condições vampíricas sobre a produção primária, sobre os subcontratados, enfim, sobre as micro e pequenas empresas.

 

Como disse antes, fico sempre muito entusiasmada quando vejo alguém explicar que o salário mínimo não pode aumentar muito por questões de "produtividade". Questão de políticas operacionais das empresas, questão de políticas nacionais vagas e mal formuladas... questão de opção, senhores! É principalmente por opção política que o aumento do salário mínimo pode levar ao desemprego!

 

(*) Não adianta dizer que estas notas de conjuntura são patrocinadas por grandes empresas, pois não?

(**) Escrita de acordo com o AO90, ao contrário dos meus textos. Mas não corrijo citações - embora vontade não me falte!

[Cuidemos de todos cuidando de nós: Etiqueta respiratória. Higiene. Distância física. Calma. Senso. Civismo.]
[há dias de muita inspiração. outros que não. nada como espreitar também os postais anteriores]

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lançado às 19:55

Onde ideias-desabafos podem nascer e morrer. Ou apenas ganhar bolor.


Obrigada por estar aqui.



18 comentários

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De Sarin a 08.12.2019 às 23:28

Olá, Rita!
Um dos meus problemas com a forma de fazer política em Portugal é exactamente este hábito de não consolidar estratégias nem de construir políticas estruturais concertadas. O salário mínimo é uma medida de protecção ao trabalhador, exclusivamente isto. O problema é que quem o paga são as empresas, Micro como Mega. E é aqui que o problema está, não no salário. O Estado falha em toda a linha quando trata as empresas como um todo - e aquela história da certificação das PME para acessos a fundos e linhas de crédito específicas mais não são do que mezinhas e panaceias. Acalmam as dores por uns tempos, mas não curam o mal - porque o mal não está, estruturalmente falando, do lado das empresas mas da sua regulamentação.
Não concordo quando dizes que uma empresa não competitiva deve ser encerrada - temos que perceber o porquê dessa falta de competitividade. Falas nas soluções que enumero - suponho que te refiras a alguns dos exemplos que apresentei ao da Vinci. Que não são soluções, são exemplos de algo que defendo há muito e que vou deixando nos meus postais sobre a matéria: as políticas fiscais têm de respeitar a escala (não podem ser apenas o número de trabalhadores ou a facturação a distinguir umas das outra); o Estado tem de disponibilizar serviços que apoiem cidadãos e pequenas empresas na apresentação daquilo que considera obrigatório (tens MPME, sabes quanto vai para HST, Contabilista, SPV caso trabalhes com embalagens, etc); o regulador tem de rever as políticas fiscais porque, embora a máquina fiscal esteja bem montada, as políticas continuam permeáveis; o regulador tem de rever a regulamentação nacional sobre deslocalizações, sub-contratações e subordinações entre empresas (a Concertação Social só é ouvida aquando do salário mínimo... onde anda quando se fala nestas matérias? O Fórum apenas representa as grandes empresas, onde estão defendidos os interesses das pequenas e dos ENI? Onde se metem as associações industriais e comerciais locais nestas matérias? etc...)


Percebo perfeitamente a tua posição, e comungo da tua descrença. E, ainda assim, não posso deixar de dizer que o trabalhador é o que menos responsabilidade tem na matéria mas é o primeiro a ser penalizado por esta gente que tanto pugna (!) pela competitividade do País! :/
Beijos, até breve (já estou quase bem, obrigada)

[a palavra a quem a quer]




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