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E a virulenta histeria

Ou apenas uma forma muito humana de estar na vida

por Sarin, em 12.03.20

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Pessoas na praia! Que Horror! Que irresponsabilidade! Que inconsciência, a exporem-se e a facilitarem a propagação do vírus!

Na praia, a céu aberto, com ar naturalmente renovado onde não há muitas superfícies de contacto. Na praia, onde o sol e a maresia podem fazer mais pelo ânimo e pelo sistema imunitário do que caixas de ansiolíticos e suplementos vitamínicos.

E os sempre indignados presumem imediatamente que quem está na praia é quem devia estar de quarentena, e a todos arrolam como idiotas irresponsáveis. E a comunicação social entrevista os que estão em grupo na esplanada  (quiçá habitantes da mesma casa? a pergunta não foi feita), mas nem uma entrevista vi a quem estava, apenas, na praia.

E logo se toma a parte pelo todo, e logo se quer fechar toda a gente em casa.

E começando nos sempre indignados, a histeria ecoa nas ondas do medo e da suspeição envolvendo, até, os geralmente ponderados.

 

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Pessoas a açambarcarem bens nos supermercados! Que Horror! Que alarmismo e que falta de civismo!

Em supermercados, locais fechados com ar forçado e cheios de superfícies tocáveis e tocadas.

E, aqui, os sempre indignados condenam o alarmismo que enche carrinhos e esvazia prateleiras. Aqui, já não se lembram da inconsciência da exposição ao risco, não são chamadas as regras sanitárias e nem sequer apontam a muito maior proximidade ou aventam que alguns compradores poderão ser indivíduos em quarentena. O bicho indignado serpenteia por estranhos meandros....

 

Tenhamos calma, juízo e consistência, caramba! Antes de julgarmos as acções dos outros, avaliemos bem as situações - ainda mais nestes tempos de guerra ao vírus e ao medo. O país deve abrandar, não parar. As regras sanitárias são para cumprir por todos, mas a quarentena e o isolamento social são para cumprir por aqueles a quem for decretado conforme a avaliação do risco. Pense-se na deliberação do Conselho Nacional de Saúde Pública sobre o encerramento das escolas e museus, pois que a minha voz não tem peso e sou, apenas, ponderada.

O país não está de quarentena - mas pode vir a estar. Apanhar ar puro - na praia, no campo ou na mata, esqueçam bancos de jardins e parques infantis - será ainda uma boa opção de lazer. E, em breve, pode bem ser das poucas permitidas.

 

Há que respeitar quarentenas e isolamentos decretados. Há que cumprir as regras sanitárias. Há que não formar multidões. Há que manter a calma - e isso inclui avaliar as situações antes de apontar dedos.

 

Visitar micro-site da DGS

 

Adenda: a calma inclui a abordagem à lista de compras.

Para quem não sabe, a DGS, para este caso concreto, aconselha mantimentos para 10 dias e 6 litros de água por pessoa. 

Aproveito para relembrar que a Cruz Vermelha tem listada a composição do kit de sobrevivência, fundamental no quotidiano de cada habitação e, até, posto de trabalho (com as devidas adequações).

 

imagem 1: Praia de Carcavelos (NiT) Imagem escolhida por representar uma forma responsável de frequentar a praia nestes tempos.

Imagem 2: Comprador algures na Ásia (fonte desconhecida). Imagem escolhida por contrastar com a reacção aos nossos carrinhos de supermercado.

 

[Cuidemos de todos cuidando de nós: Etiqueta respiratória. Higiene. Distância física. Calma. Senso. Civismo.]
[há dias de muita inspiração. outros que não. nada como espreitar também os postais anteriores]

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lançado às 11:05

Desde há algum tempo que tenho este postal mentalmente rascunhado. Nasceu pela eutanásia mas, e nem de propósito, será dado à luz pelo COVID-19.

 

Defendo uma democracia muito mais participativa, e defendo-o há muito e de muitas formas. As nossas elites políticas, que de elites pouco terão mais do que a imunidade e a impunidade, são incapazes de ouvir os eleitores e, pior, são incapazes de falar claramente com os eleitores, de ver os eleitores, de sentir os eleitores. Excluo, obviamente, os homens-espectáculo nados e criados nas televisões, para quem os eleitores são o pão-nosso que, mastigado, os modela. E, destes, excluo o omnipresente Marcelo, pois que nasceu modelado.

Voltando à nossa democracia, entendo que os cidadãos podem e devem ter mais participação directa nas decisões governativas, nomeadamente nas adesões a tratados internacionais, nas eleições de órgãos reguladores e outras cúpulas, e nas definições das políticas gerais. Não são necessárias competências específicas para se ser deputado pelo mesmo motivo de não serem necessárias competências específicas para se ser cidadão - e defendo que todos temos o direito de decidir quem governa o quê.

 

No entanto, há decisões que requerem competências específicas. Há matérias que requerem conhecimento técnico, que não são questão de querer e, muito menos, de crer. A Saúde Pública é uma delas.

Quando na AR se resolveram a aprovar a inclusão de algumas vacinas no Plano Nacional de Vacinação contra a opinião da DGS, respinguei e resmunguei com tal usurpação de funções, embora ainda percebesse o objectivo da manobra - poupar custos a muitas famílias. Mas pais e professores fazerem petições pelo encerramento de escolas porque têm receio? Então mas as crianças e jovens, enquanto grupo etário, não são os mais resistentes? E os casos de risco de exposição não estão sob vigilância? E a DGS não está a acompanhar o mapa evolutivo? Mas estamos doidos?! Já agora, quem fica com os petizes - os avós, muitos dos quais na faixa etária de maior risco? Tenham juízo e atentem nas medidas de higiene - a Alice Alfazema deixou pistas bem-humoradas -, tenham decência e cumpram as regras de auto-isolamento se suspeitarem de risco de exposição, tenham calma e deixem as questões técnicas aos técnicos de saúde - que não estão nem nas associações de pais nem na Assembleia da República!

 

Da mesma forma que há decisões que apenas devem ser tomadas por técnicos, há outras que não deveriam incumbir a ninguém que não o próprio. Refiro-me a todas as questões do exclusivo foro individual e, especificamente, à eutanásia. Sim, sei que ninguém é uma ilha e que a minha vida e a minha morte têm ramificações nas vidas de outros. Mas continuam a ser a minha vida e a minha morte, e as opções que tomo são da minha responsabilidade. Ninguém tem o direito de me impor se devo viver ou morrer - nem sequer os tais médicos que eventualmente farão parte das estapafúrdias comissões de avaliação, das quais falarei noutro postal. E muito menos esse direito terão o meu vizinho e o tasqueiro da rua de baixo, pessoas simpáticas e esclarecidas mas às quais não reconheço qualquer poder de decisão na minha vida privada. Ou na minha privada morte.

Há matérias que, pura e simplesmente, não são referendáveis. A eutanásia* e o aborto, por exemplo, porque apenas dizem respeito à vida do próprio**, ou a escravatura e a pena de morte, porque dizem respeito à vida de terceiros assim gerida por segundos. No fundo, a mesma questão.

 

Não quis entrar em grandes discussões sobre as matérias peticionadas, não era objectivo do postal. Mas queria deixar bem patente o meu repúdio por estas manifestações de democracia participativa, que considero completamente desajustadas.

 

Descubram os chapéus que podem usar, gentes destas petições, porque chapéus há muitos... mas estes não me parecem assentar-vos bem.

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* Voltarei à Eutanásia, assim o havia dito à MJP e ainda tenciono cumprir.

** Antes de me atirarem o conceito de "valor da vida humana desde a concepção", que fique claro que apenas reconheço como Ser os fetos viáveis em incubadora, por muito que acarinhe os embriões e os fetos em desenvolvimento. Mas sem órgãos vitais não passa de projecto, e a incubadora humana é que decide se é incubadora ou mãe. Não é questão de fé, é matéria de facto.

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lançado às 19:05

COVIDos moucos seguem felizes

por Sarin, em 10.03.20

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Sim, a taxa de mortalidade é inferior a 3%. Com esta relativamente baixa taxa de mortalidade seguem dançando e rindo os que, abusando do senso comum, desvalorizam os efeitos de uma epidemia. Claro que não perguntam aos mortos se consideram a taxa baixa, mas talvez devessem começar por aí. Porque não se conhecem exactamente os grupos de risco - aliás, nada se conhece exactamente sobre os efeitos da COVID-19 - mas, sabendo-se que os indivíduos com doenças respiratórias são vítimas potenciais e que em Portugal estas doenças são a terceira causa de morte,  as medidas de contenção decretadas apenas pecarão por tardias. Talvez não pensem os ilustres ignaros  nas consequências de ter os hospitais sobrelotados com pacientes de risco ou de ter de definir a maior esperança de vida como mecanismo de triagem para cuidados médicos; talvez não imaginem que empresas a laborar a 30% ou  a 40% acabam por não laborar de todo, se se tratar de empresas de produção em linha, ou que os custos do abrandamento possam ser muito superiores aos custos de uma paragem global porque as empresas em plena capacidade continuam a precisar de matéria-prima ou de componentes; ou talvez nem acreditem que a mortalidade é, afinal, a menor das preocupações numa epidemia desta natureza.

 

Sim, a comunicação social tem feito da COVID-19 o astro e o coadjuvante das notícias. O que é normal, tudo o que remotamente cheire a alarme, vende. Mas, pela primeira vez, e desprezando embora o alarmismo imprimido em títulos começados com "mais uma morte..." e similares, agradeço à Comunicação Social a insistência no tema. Porque, e reiterando o desprezo pelo sensacionalismo que ilumina tantos órgãos, pela primeira vez o excesso de informação tem sido de efectiva informação. E afigura-se-me que os próprios canais noticiosos estão em auto-moderação da linguagem usada - talvez tenham percebido que a gravidade é pandémica? Claro que há sempre os que medem as palavras pelo retorno financeiro imediato - leia-se cifrõ€$ - mas a generalidade dos que tenho lido e ouvido aparecem-me bem mais serenos do que o normal.

Já pelos blogues e pelas redes sociais a figura é outra:

aos que desvalorizam a epidemia pela taxa de mortalidade (nem me refiro aos idiotas que consideram falsos os dados da OMS porque na casa deles ninguém morreu) e aos que consideram excessivas as medidas de contenção por "não ser caso para tanto" (em Itália não concordam, a quarentena foi agora decretada para todo o país),

juntam-se os que a levam demasiado a peito, gritando contra a insensibilidade das piadas que se fazem (desconhecerão que o humor continua a ser uma arma contra o medo e contra o stress?) ou acusando as autoridades de nada fazerem (ao desconhecimento tomam-no como certeza e sai-lhes a omnisciência manca),

e ainda os que esperam que as autoridades façam tudo e que façam já, desde ensinar a lavar as mãos até fechar o país. E aguinha de malvas?, apetece perguntar, como se não fôssemos adultos capazes de tomar decisões responsáveis sobre viagens e frequência de eventos numa altura em que o surto ainda é surto. Como se tivesse de ser o Estado a decidir tudo por nós e pelos nossos - e mais  absurdas sinto tais urgências quando as leio quer a defensores do Estado Social quer aos que desejam encerrá-lo... mas desde sempre ouvi dizer que até alguns ateus rezavam a Santa Bárbara quando o céu lhes caía na cabeça.

 

Talvez que o SNS não esteja preparado para uma epidemia. Mas qual o país que gere os seus recursos hospitalares pensando em respostas a epidemias desconhecidas? Claro que há que prever contingências, e não sei se os hospitais de campanha são suficientes se não tivermos pessoal especializado - o tal que falta nos hospitais que não são de campanha. No entanto, a melhor resposta a um surto continua a ser a contenção, para que não derive em epidemia. Já a epidemia de maledicência, essa é impossível de conter - e nunca nenhum governante responderá à altura de todas as fasquias, embora uns se coloquem mais a jeito para levarem com ela no cocuruto.

E talvez os cidadãos não estejam preparados para uma epidemia. Não, retiro o talvez. Os cidadãos não estão preparados para uma epidemia. Os viajantes constipados entram sem máscara nos transportes públicos (a constipação pode ter um coronavírus na origem, mas quem se rala?), os trabalhadores arejam conjuntivites e amigdalites, os utentes saem das retretes sem lavar as mãos, as sanitas continuam sem tampa e os lavabos sem sabão... e podia continuar com os exemplos da falta sistémica de hábitos e cuidados de higiene. Que se tornam fundamentais quando em cenários de contágio. Lamentavelmente, não será ainda desta que os aprenderão. Mas todos estes seguem felizes, embalados nas certezas de no pasa nada ou é o armagedão... e seguem surdos à razão.

 

imagem do sítio a razão.

Nota: à hora a que escrevo parece não estar ainda comprovado que os animais de companhia possam ser infectados por COVID-19

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lançado às 15:32

Não quero o Dia da Mulher

por Sarin, em 08.03.20

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Quero calendários sem Dia da Mulher.

Não quero flores nem bombons,

senhores,

quero paridade.

E não quero parabéns nem poemas,

fodam-se os poemas sobre a nossa gentil e delicada alma,

redomas onde nos aprisionam

fingindo celebrar-nos!

(como se fôssemos unas,

iguais...

e domesticadas, talvez!)

Quero respeito por,

apenas,

Sermos.

Quero respeito por esse direito.

E quero-o todos os dias,

dispensados os lembretes automáticos

e as campanhas sazonais.

 

Não, não festejo este dia - 

nada tenho a festejar,

tanto falta conquistar...

Só quando obsoleto,

dispensável

- mera efeméride -

farei festas e jantares e cabriolas

 ao dia 8 de Março!

 

Porque,

Hoje,

os dias são ainda desiguais

e as horas não são unissexo.

 

 

Num abraço, a memória de todos os feministas, passados presentes e futuros.

 

 

imagem: Cinisca, de Sophie de Renneville (ant. 1823). Cinisca de Esparta, a primeira mulher a ganhar os Jogos Olímpicos da Antiguidade quando as atenienses ficavam em casa e as espartanas geriam negócios e combatiam.

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lançado às 21:30

Onde ideias-desabafos podem nascer e morrer. Ou apenas ganhar bolor.


Obrigada por estar aqui.


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e uma viagem diferente



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